9 de dezembro de 2007

O Desvio

A noção de desvio aparece com a Sociologia Americana no fim dos anos 50 como algo mais extensivo que as noções de delinquência ou de criminalidade. O desvio e o crime deixam de ser considerados sinónimos. Pois existem condutas que não são necessariamente criminosas, e são, igualmente desviantes. Todavia, muitas das vezes, os dois conceitos desvio e crime sobrepõem-se. O desvio não é só um comportamento em que o indivíduo infringe uma norma por acaso, mas trata-se de uma infracção motivada e contextualizada. Sendo assim, o desvio é um conjunto de comportamentos que não são conformes ás normas e valores partilhados na sociedade, e, por isso podem ser sancionados pela mesma.
Na sociologia do desvio, há uma focalização na conduta, para além de uma pesquisa criminológica. Ao estudarem os comportamentos desviantes, os sociólogos, procuram perceber porque uns são considerados como tal e outros não, e, ainda como a noção do desvio, é vista de diferente forma numa mesma sociedade. Nestes estudos há uma centralidade no poder social e como as clivagens entre as diferentes classes sociais vão influenciar o indivíduo
Foram desenvolvidas algumas teorias com bases Biológicas e Psicológicas, que acreditavam que o crime e outros tipos de desvios seriam geneticamente determinados.
Actualmente, o desvio é analisado tendo em conta o contexto social específico, no qual emerge.
Partindo do pressuposto que estas teorias foram “desacreditadas”, surgem quatro teorias: as Teorias Funcionalistas, as Teorias Interaccionistas, as Teorias de Conflito e as Teorias de Controlo Social.

- Teorias Funcionalistas
Durkheim revela-se o mentor mais importante. Perspectiva o crime e o desvio como resultado de ausência de regulação moral e determinadas tensões estruturais, na sociedade. Este autor surge com o conceito de anomia, como sendo um sentimento de desorientação existente, nas sociedades modernas. Aliás Merton, com base neste conceito “anomia”, tenta explicar o desvio, como sendo um conflito entre as normas e os valores da sociedade.

- As teorias Interaccionistas
Para os Interaccionistas o desvio é um “fenómeno socialmente construído” (Giddens, 2004, p.211), põem assim de parte toda e qualquer ideia de que existam tipos de comportamentos desviantes como anteriormente era visto de uma perspectiva Biológica e Psicológica.
Estes autores começam, então, por estudar porque são considerados determinados comportamentos e indivíduos ou grupos são vistos como desviantes em detrimento de outros.
Esta teoria sobre o desvio deve muita da sua influência ao autor Edwin H. Sutherland, que apresentou a teoria da ‘Associação Diferencial’. A teoria baseia-se no facto deste autor acreditar que o motivo pelo qual determinados indivíduos ou grupos terem um comportamento desviante, deve-se às várias subculturas que uma sociedade compreende em si, onde podem acontecer situações que potenciarão uma maior tendência para gerar comportamentos fora da norma. Ou seja, os indivíduos são assim como que induzidos para este mundo fora das normas sociais vigentes, através de uma associação que existe entre grupos de pares nestes ambientes.
A Teoria da Rotulagem vem assim reforçar a discordância das teorias Biológicas e Psicológicas, pois não acreditam que o desvio seja um conjunto de características do indivíduo ou grupo, mas sim um processo de interacção entre os que são rotulados como tendo comportamentos desviantes e os que agem segundo as normas. Tentam assim perceber como o indivíduo ou grupo são rotulados pelos outros.
Percebem, então, que as normas, as leis, são impostas à sociedade dos ricos para os pobres, das maiorias para as minorias étnicas, ou seja, uma identidade de desviante que um individuo possa ter estará ligada à rotulagem que lhes é feita por outros indivíduos ou grupos que detêm o ‘poder’, de alguma forma na sociedade. Este poder sobre a opinião pública é de certa forma, para os interaccionistas, serão através de dois principais actores: a Política e os Media. Estes têm o poder necessário para controlar a forma vistos determinados grupos, rotulando-os de desviantes. Um indivíduo pode até nunca ter cometido nenhum crime, mas ser rotulado como desviante. Por isso aqui faz-se uma diferenciação importante entre o que é o desvio e o que é crime. Sendo assim, o estigma que pode ter um indivíduo não tanto produzido pelo crime, mas sim através das características que lhe são apontadas pelos outros rotulando assim o indivíduo, danificando a sua auto-estima.
Becker é um dos autores que mais é associado a esta teoria da rotulagem. Segundo este “o comportamento desviante é aquele que as pessoas rotulam com desviante” (Giddens, 2004, p.212), ou seja, existem factores que vão levar à rotulagem do actor social como desviante. Vai assim, esta rotulagem do actor, influenciar a forma como os outros vêm o indivíduo e como este se vê a si próprio (como já referimos anteriormente).
Este conceito vai ser estudado mais profundamente pelo autor Lembert, que tenta logo de início desmistificar a ideia que o desvio, afirmando que este é mais frequente do que é concebido pela maioria. Partindo deste princípio, divide o desvio em duas categorias: Desvio Primário e Desvio Secundário. Por Desvio Primário entende um comportamento inicial de transgressão às normas e leis vigentes que de certa forma não fica ligada à identidade do actor social, ficando assim à margem da sua identidade, sem consequências de maior perante si e a sociedade. Já no que diz respeito a Desvio Secundário, o autor refere-se aquando o indivíduo acaba por assimilar o rótulo de desviante que lhe é imposto e acaba por se ver a si próprio como tal, tornando-se assim central na sua identidade. Este facto pode então levar à continuação de tal comportamento, assumindo esse rótulo.
Os interaccionistas afirmam que o desvio é uma construção social, não se dando só pelo crime, mas pela forma como os outros irão ‘ver’ o indivíduo rotulado.

- A Teoria do Conflito
Os autores defensores desta teoria entram em ruptura com as teorias anteriores baseando-se na ideologia de Marx, em que o desvio é tomado como uma opção, contrariamente defendido tanto pelas teorias Biológicas e Psicológicas, como pela Teoria Interaccionista de rótulo.
Estes autores acreditam que os comportamentos desviantes são opções dos indivíduos em resposta a situações de desigualdade existentes na sociedade. Daí acreditarem que o desvio é uma consequência da diferente distribuição de poder na sociedade, onde existe a tentativa de manutenção desse mesmo poder por parte da classe dominante subjugados as restantes classes, criando assim conflito entres classes podendo levar ao desvio.

- A Teoria do Controlo Social
Nesta teoria o crime é resultante dos conflitos que existem entre os impulsos que vão conduzir ao crime, ao desvio, e as normas, leis da sociedade que contrariam esses comportamentos.
A sua focalização não está em perceber o que levará o indivíduo a determinado comportamento desviante, assumindo que todos os actores sociais poderão ter 1 comportamento desviante dado a oportunidade para tal, já que este age de forma racional.
O autor Hirschi, na sua obra Causes of Delinquency (1969), propõe a existência de 4 tipos de ligações entre os actores e a sociedade com as suas leis e normas: o apego, o compromisso, a participação e a crença. Quanto mais fortes forem estas ligações, mais forte será o controlo social e conformidade dos indivíduos perante as normas e leis impostas pela sociedade. Mas se estas ligações forem, pelo contrário, fracas ou não existentes, podem levar ao crime e ao desvio. Com esta teoria o autor apresenta-nos os actores sociais como individualistas e que estas fracas ligações com as normas da sociedade são uma consequência de uma socialização desajustada. Apesar de estarmos perante um trabalho não muito extenso, achamos que esta frase é a visão mais actual da sociologia sobre o desvio, tornando-se de certa forma uma pequena conclusão. “…do ponto de vista sociológico, o desvio é um conceito relativo. O comportamento é sempre aferido pelas normas sociais em vigor. Como as normas não são universais nem eternas, os comportamentos acabam por ter diferentes leituras, de acordo com o grupo e com o contexto espácio-temporal.” (Dias, 2002, p.30).

Ana Maria Ribeirinha Teixeira; Ângela Maria Teixeira de Sousa; Carla Alves França; Catarina Raquel Almeida Fernandes e Patrícia Daniela dos Santos Costa.